Grupo Pestana: De 500 milhões de euros à diversificação do negócio devido à pandemia
Dionísio Pestana, fundador do Grupo Pestana, durante a VI Cimeira do Turismo Português,abordou alguns dos desafios da empresa que comemora este ano o 50º aniversário.
Dionísio Pestana, fundador do Grupo Pestana, maior cadeia hoteleira nacional, durante a VI Cimeira do Turismo Português, que decorreu em Lisboa, organizada pela Confederação do Turismo de Portugal (CTP), abordou alguns dos desafios da empresa que comemora este ano o 50º aniversário. Para o responsável, está na altura de diversificar os investimentos do grupo, uma lição que retira da pandemia.
Numa conversa solta, foram vários os assuntos que abordou, revelando que se correr tudo bem nos meses que faltam até ao final do ano o grupo atingirá os 500 milhões de euros de volume de negócios, “o que permite consolidar o nosso balanço para a crise que se avizinha”. Para Dionísio Pestana isto significa 50% da força do Grupo Pestana, “pois temos de ter um balanço forte, estamos a crescer e temos de gerir bem a operação”. Revelou ainda o responsável que “de há um ano para cá, convertemos 70% da nossa divida, a longo prazo, a 15 anos, a uma taxa fixa de 2/3%. Isso dá um rácio baixo face ao nosso EBITDA, contando nós com 200 milhões de euros de cash-flow por ano”.
Para Dionísio Pestana ,“ao longo destes 50 anos passámos por sete crises e o modelo do negócio turístico repete-se ciclicamente. Ou seja, depois de um excedente feito começa-se a consolidar, ao qual segue-se um crise. Após dois anos de crise e uma recuperação ao fim do terceiro ano, ao fim de 3/4 anos segue-se outra crise”. Sendo assim, indica o responsável que “para sobrevivermos temos de ter muita confiança e nunca desistir. Dentro do grupo tentamos fazer desta maneira os investimentos, baseados na experiência e tempo (de operação)”. Revela o hoteleiro que “a primeira lição que aprendi foi ter sempre um plano B que nos permita ter tesouraria nas alturas de crise. As empresas com investimentos altos e com projetos de milhões de euros não podem confiar totalmente na projeção de retorno feita para o prazo temporal que for, pois se algo corre mal, existe o risco de a tesouraria não conseguir complementar esse défice.” Sendo assim, acrescenta Dionísio Pestana que “no nosso caso, sempre apostámos no time-sharing que funcionou ao nível da tesouraria para o grupo, depois investimos no negócio dos Casinos, na Madeira e São Tomé, numa imobiliária turística, que foi suficiente para cobrir momentos difíceis”.
Relativamente ao futuro, o empresário afirma estar preocupado, “pelo que aí vem, mas também pelo cenário criado durante a pandemia”. Para o responsável, a Covid foi uma autêntica surpresa ao nível de gestão. “Não estávamos preparados para a Covid. Procurámos uma diversificação do negócio em diversas geografias do mundo – Brasil, África, EUA, várias cidades da Europa -, porque sempre achei que se houvesse um problema num dos países, a tesouraria dos outros compensaria o negócio”, afirmou o empresário, “mas, com a Covid, tivemos os 100 hotéis fechados, com cerca de cinco mil funcionários à espera do ordenado”. Este foi um momento delicado, que Dionísio Pestana reconhece que foi ultrapassado numa solução tripartida. “Conseguimos, mas tenho de agradecer ao Estado português e aos colaboradores. Foi um esforço tripartido, o Estado pagou 1/3 dos ordenados, a empresa 1/3, os trabalhadores deixaram de receber 1/3. A verdade é que a confiança da equipa saiu deste período mais forte. Abrir e fechar hotéis era a nossa especialidade durante a Covid”, indica.
Relativamente ao próximo ano, Dionísio Pestana indica que “vamos agora começar os orçamentos para o próximo ano. Em primeiro lugar iremos definir os custos esperados. O orçamento será definido pelos custos e não pelas receitas. Temos de controlar os custos”. Seguir-se-ão depois cenários consoante a procura, “em que estamos dependentes do mercado português, alemão e inglês, que representam 70% do nosso negócio”. Indica o responsável que “se houver variações nestes mercados estaremos atentos e tentaremos antecipar os problemas. Acredito que o mercado inglês para a Madeira e Algarve vai correr bem, porque estamos fora da rota dos conflitos. O mercado nacional vai descer, mas tem margem para resistir. No entanto, o cenário poderá ser alterado se sair da Rússia mais alguma loucura, esta é a minha maior preocupação. O mercado alemão já desde 2019 que se anda a defender, tiram menos férias e vêm menos vezes. Temos que apostar em mercados como o Brasil e os EUA”.
Relativamente ao papel do Estado no mercado, Dionísio Pestana considera que “não precisamos de ajudas diretas, essa não é uma prioridade. Agora necessitamos de uma reformulação dos impostos em Portugal, a começar pela TSU, pagamos 23,75 por trabalhador, só que este não entende isso. O trabalhador não entende que esse valor é parte da sua remuneração. Essa receita deveria estar no ordenado liquido do trabalhador. Isso daria outra perspetiva de entendimento aos colaboradores da remuneração das empresas”. Revela então o responsável que “na nossa empresa o custo com mão-de-obra significa 35% das nossas receitas, pois também pagamos os prémios, que rondará 1/3 deste montante. Os descontos sobre os ordenados são muito elevados o que causa uma insatisfação dentro das organizações. O Estado tem que pensar este modelo, fazer uma reforma.”
Relativamente à ajuda do Estado, o empresário remete para a resolução de problemas do país ou o avanço de reformas: “O novo aeroporto em Lisboa já faz falta há 10 anos. Quer se goste quer não desde o tempo da Troika que Portugal deu um salto, porque foram tomadas decisões que os governantes portugueses têm capacidade de tomar mas a sua prioridade é o jogo político. Foram feitas neste período reformas necessárias, para nós empresários estas vieram criar uma nova dinâmica, corrigindo muito do que vinha de trás e que estava mal. Hoje as empresas portuguesas estão melhor e mais consolidadas, dando o salto depois da Troika”.
Relativamente ao potencial de negócio de turístico do país o hoteleiro é perentório: “Portugal como destino turístico e como país tem um potencial enorme para mais 50 anos, no mínimo. Temos de fazer mais ao nível da eficiência, no licenciamento aguardamos processos com três e quatro anos, o setor tem muitos projetos na carteira, já sabemos como funciona, uns aceleram, outros param, depois são retomados, dá-se o inverso”. Considera o interlocutor que “precisamos de um diálogo mais franco, mais aberto, com o Estado e entidades públicas, pois há uma desconfiança em Portugal relativamente ao empresário. Os departamentos do Estado têm uma desconfiança sobre o empresário por querer fazer algo para ganhar muito. Mas temos regras, temos leis e têm de ser para cumprir. As empresas são quem cria a riqueza e postos de trabalho. Mas precisamos de mais velocidade na aprovação dos projetos. Fora de Portugal temos essa perceção, por exemplo, em Berlim não tivemos estas questões”.
Uma das amarguras denotadas durante a conversa com o empresário é o não aproveitamento da região do Algarve do ponto de vista económico. “O Algarve é uma Flórida, tem todas as condições para ser uma das regiões de Portugal mais ricas. Poderia investir-se ali em universidades, em empresas startup, é uma região que tem condições para tudo acontecer, mas tem que se ter um MasterPlan”, indica.
Se gostava que os políticos o ouvissem, Dionísio Pestana rejeita: “não gostava que me pedissem a minha opinião, pois para ser ouvido e ser ignorado ou não ser tomado em consideração, não vale a pena. Cada um que siga o seu caminho, eu tenho o meu foco. Mas estamos todos a perder, a perder no tempo e a perder oportunidades. Em Portugal somos poucos grandes grupos hoteleiros, três/quatro”.
Relativamente ao desenvolvimento da empresa, o hoteleiro indica que tem sempre projetos em carteira. Acrescentando que ”em Portugal somos líderes há muito anos, queremos continuar. No plano internacional, ter mais expressão nas capitais europeias e também nos EUA. Na política de diversificação dos mercados temos em conta a política do risco cambial, não nos esquecemos da crise na Grécia há uns anos e eu tenho a ideia que um dia pode haver um Euro do Norte da Europa e outro Euro do Sul da Europa e quero estar mais no primeiro Euro, porque uma desvalorização do Euro do Sul iria tirar-nos valor”.
Reforça ainda o hoteleiro que “no turismo, investir em Portugal é sempre bom, tem um bom retorno e sempre uma valorização. Com um euro forte, taxas de juro baixas, tem sido bom investir em Portugal”.
Quanto ao futuro, o seu desejo passa por “manter a empresa forte, firme e consolidada. Em bons anos podemos ter 50/100 milhões de euros para investimento. Com a Covid já percebi que deveremos ter que diversificar os investimentos, pois não fui tão esperto como pensava, ou seja, começamos a pensar em algumas alternativas”.
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