Cristina Siza Vieira dá a conhecer a dinâmica da AHP em entrevista ao Turisver
O trabalho da AHP em prol dos seus associados, as ferramentas e recursos que coloca à sua disposição, deram mote à conversa com a vice-presidente executiva, Cristina Siza Vieira, em que ficámos a conhecer melhor a dinâmica da Associação e em que também se falou do próximo congresso que terá lugar em Fátima. A entrevista com Cristina Siza Vieira antecede a que iremos publicar com o presidente da AHP, Bernardo Trindade, que também participou em parte desta conversa.
Este ano de 2022 já veio normalizar o trabalho da Associação da Hotelaria de Portugal junto dos seus associados?
Durante a pandemia esse trabalho foi intensificado em termos da intervenção pedida pelos associados e da intervenção política junto da Tutela. Neste momento há outras preocupações, as necessidades de apoio e de informação permanente são menos intensas porque já não existe aquela circunstância anómala. Por isso podemos dizer que o nosso trabalho está mais dentro dos parâmetros do que é normal.
A AHP coloca várias ferramentas e recursos à disposição dos associados e gostaria de falar de algumas delas, começando pelos Gabinetes de Apoio criados este ano. Os associados têm aderido a estes novos Gabinetes?
Os associados costumam recorrer aos Gabinetes quando necessário. Particularmente no Gabinete de Apoio à Gestão e ao Investidor, além da informação periódica que damos relativamente a instrumentos de financiamento, aberturas de candidaturas, instrução de procedimentos de apoio e do acompanhamento do que se está a passar em termos de Quadro Comunitário, Quadro Nacional, etc., os associados recorrem quando é necessário instruírem candidaturas e proporem investimentos. Vão até mais longe porque, por força das circunstâncias e dos tempos, estes Gabinetes também têm um papel importante em matéria de certificações, quer ambientais quer em termos de apoio à gestão quotidiana e corrente. Isto leva a que, em relação ao Gabinete de Apoio à Gestão e ao Investidor o recurso seja grande, sobretudo em matérias mais novas.
No Gabinete de Apoio Digital e à Digitalização, ainda não está cá fora a totalidade da plataforma que, entre outras coisas, vai partilhar boas práticas, pelo que existe alguma curiosidade mas ainda não recursos.
Relativamente aos outros Gabinetes, o de Apoio Jurídico é o mais intensamente procurado. No Gabinete Fiscal nós só damos informação genérica e depois cada pedido, até por razões sigilosas, é diretamente feito à Espanha & Associados que é quem nos assegura o Gabinete, pelo que não temos tanto feedback. Aquele que é permanentemente usado é o Gabinete de Apoio ao Associado porque a legislação é muito dinâmica e evolutiva e a sua interpretação exige esse apoio e da nossa parte temos todo o interesse em que seja uniformizada até para que as entidades fiscalizadoras saibam que existe uma orientação genérica por parte da AHP.
‘Click2Portugal’ não é uma plataforma de vendas nem uma central de reservas
A plataforma ‘Click2Portugal’ gerou muita expectativa quando foi lançada, em 2018. Na tomada de posse dos corpos sociais da AHP o presidente apelou a uma maior participação dos associados neste projeto. Em que pé é que está a plataforma?
O ‘Click2Portugal’ teve uma evolução num sentido diverso daquele que tinha sido inicialmente previsto. O ‘Click’ não é uma plataforma de vendas nem uma central de reservas porque os tempos mudaram, o investimento necessário para ter uma plataforma destas a concorrer com outras ‘bookings’ era incalculável quer do ponto de vista tecnológico, do marketing e do seu posicionamento, quer porque a venda direta tem sido, felizmente, cada vez maior.
Claro que continuamos a ter intermediários e nunca os poderemos pôr de parte porque são fundamentais na distribuição, mas cada vez mais os hotéis apostam na venda direta. O ‘Click’ adaptou-se às circunstâncias e neste momento é um agregador da oferta, uma porta de entrada na busca de hotéis por regiões, por categorias, mas não é uma mera montra até porque além dos critérios de busca tem rankings, só que depois a reserva e a venda são feitas diretamente. Isto também por força de uma outra circunstância que tem a ver com a cibersegurança, porque o investimento que é necessário fazer por quem fica detentor dos dados dos clientes, designadamente cartões de crédito, não é compatível com instrumentos de caráter mais privado. A evolução que foi feita no ‘Click’ respondeu aos tempos, continua a ser muito útil e muito interessante como porta de entrada e porque permite criar códigos que possam responder a eventos específicos, como foi ocaso da Conferência dos Oceanos e como vão ser as Jornadas Mundiais da Juventude. O ‘Click’ tem esses códigos para campanhas especiais mas tanto o acompanhamento como a reserva, são feitos pelos hotéis.
Neste momento, há cerca de 700 aderentes ao ‘Click2Portugal’, a adesão é muito mais simples, nós próprios padronizamos as fotos e ainda estamos a desenvolver duas funções na plataforma.
Há uns anos, a AHP desenvolveu o Programa HOSPES em que tem algum orgulho. Já este ano foram realizadas duas ações direcionadas aos refugiados da Ucrânia. Que outras iniciativas têm tido?
Nós temos muito orgulho neste programa – como “mãe” do projeto tenho um imenso orgulho nele, até porque quando nasceu nem se falava nestas questões.
Na sua essência de economia circular e de reintrodução dos bens e equipamentos no terceiro setor, o Programa HOSPES continua a funcionar bem e a ter muita procura. Ainda há pouco a Câmara Municipal de Lisboa precisava de equipar um centro, foi pedida a nossa colaboração e de imediato tivemos um hotel a responder.
A Feira do Emprego funcionou bem, até com recurso a outras ferramentas tecnológicas – já não estamos só na base do trade off entre aquilo que é necessário pelo terceiro setor e aquilo que é possível os hotéis oferecerem. Falta-nos, sou franca, ter mais estruturado o pilar do emprego inclusivo. Há muita dispersão, muitas associações a trabalharem com cidadãos portadores de algum tipo de deficiência e é complicado articular competências entre o IEFP, entre nós, os seguros, o tipo de apoio que é necessário fazer. É algo que eu gostaria muito de ver desenvolvido e não tem sido fácil.
O pilar da sustentabilidade ambiental tem tido um crescimento muito interessante, não são apenas empresas que querem, como fornecedores, em toda a supply chain, perceber como podem credenciar-se para estar mais próximas da hotelaria.
Outra parte em que temos estado mais envolvidos – eu própria sou representante no grupo de estudos do Turismo de Portugal – é a de tentar perceber se ao nível do sistema GRI [Global Reporting Initiative] e do envolvimento dos hotéis com os pilares do ESG [Environmental, Social and Governance] se consegue encontrar um caminho comum.
Há mais algumas coisas na manga mas ainda é cedo para as divulgar, o que destaco é que este é um programa estruturado e em evolução continua.
AHP vai relançar o Tourism Monitor melhorado em 2023
O Tourism Monitor chegava-nos muitas vezes com um número de respostas muito limitado. Com variadíssimas entidades a divulgar números, continua a justificar-se este instrumento? Atualmente há maior adesão por parte dos vossos associados nas respostas aos inquéritos?
Se se justificava ou não foi uma questão com que nos debatemos antes de o descontinuarmos. A ferramenta que foi desenvolvida em 2009-2010 já estava obsoleta e foi necessário fazer um investimento muito pesado, particularmente no Hotel Monitor e não correu particularmente bem. Queríamos maior automação na recolha de dados e que a ligação aos channel managers fosse mais fluida e também queríamos ter dados diários.
Mas a primeira pergunta é essa mesmo: será que ainda é útil ter todos estes dados no pilar da operação? O feedback que tivemos é que, na operação, continua a ser muito útil mas há a outra parte da questão que é a periodicidade, o ter que aguardar e eu era muito avessa a lançar os dados antes de ter uma amostra robusta e isso era crítico.
A pandemia veio interromper o curso porque não fazia sentido recolher dados de 2020 e 2021, mas queremos relançá-los em 2023, com uma maior automação na recolha de dados e com outros indicadores que nos permitam fazer a média das médias e uma análise prospetiva.
Continuamos a considerar que é útil, os hoteleiros valorizam a informação que é prestada diretamente sobre a operação. A recolha de dados é um esforço que continuamos a ter que fazer porque os hoteleiros já preenchem um sem número de inquéritos. Acresce outra questão que é a da cibersegurança e sob esse ponto de vista teríamos que garantir um nível de safety que não penso que consigamos fazer, pelo que vamos continuar a depender bastante de uma partilha de informação que anonimizamos e não partilhamos.
Foi anunciada a criação de um marketplace. Como é que está o projeto?
No anterior mandato, o Alexandre Marto Pereira lançou a ideia de aproximar os fornecedores de bens e serviços que já são nossos parceiros de quem faz as opções de procurement nos hotéis, através de um marketplace. É uma feira de encontro e neste momento estamos a apontar para abril de 2023, a nossa ideia é que nessa altura possamos preparar esse encontro.
Bernardo Trindade – Sobre esta questão gostaria de deixar claro que o marketplace vai mesmo acontecer. É fundamental para nós aproximar os nossos parceiros, aqueles que caminham connosco ao longo de muito tempo, que estão muitas vezes no congresso. Indiscutivelmente, o congresso é muito importante mas também era importante fazer mais qualquer coisa que será o espaço próprio, particular, em que juntamos associados e representantes de associados porque para tratar de áreas como compras, tecnologia, prestação de serviços fundamentais à hotelaria, não é o administrador que o faz, muitas vezes nem sabe mas na empresa há quem saiba e é essa aproximação que vai permitir uma melhor decisão.
” No nosso congresso não temos um grande peso da parte institucional, temos é uma preocupação muito grande em trazer oradores de fora da indústria, ou da indústria mas internacionais, que sejam uma oportunidade para os nossos hoteleiros ouvirem”
Estamos a menos de dois meses do próximo congresso da AHP e gostava de saber que expectativas existem?
O ano tem sido particularmente difícil para os hoteleiros, a vários níveis. Desde os fornecimentos às questões tecnológicas, tudo tem sido mais complexo e por via disso, e pelas mudanças a que os tempos têm obrigado, nós queríamos inovar neste congresso, apesar de se ir realizar em Fátima, um destino tradicional e que não é evidente do ponto de vista do turismo de congressos. Isto colocou desafios difíceis mas com tantas mudanças que estão a ocorrer, achávamos que este era o momento de marcar a mudança e fazer de Fátima um destino que se pode afirmar noutros segmentos para além do turismo religioso.
O modelo, em termos e duração, está estabilizado: um dia e meio de trabalhos, com algo a acontecer na véspera. Este ano não vamos fazer um get together como fazíamos, também aqui vamos mudar, e na parte institucional o Dr. Bernardo Trindade alterou também uma parte do modelo. No nosso congresso não temos um grande peso da parte institucional, temos é uma preocupação muito grande em trazer oradores de fora da indústria ou da indústria mas internacionais, que sejam uma oportunidade para os nossos hoteleiros ouvirem. Entre os nossos 850 associados nem todos são de grandes grupos e trazer cá boas práticas e oradores-inspiradores é algo que nos motiva. É um congresso muito mais desafiante e difícil de montar porque gostamos de trazer quem nos possa inspirar.
Os temas são os que estão na agenda: os recursos humanos e a retenção de talento, mas olhados na perspetiva de outras indústrias; os tempos de mudança na gestão, no investimento… e outros mais numa perspetiva de futuro.
Apesar de algumas mudanças, na essência o nosso congresso será aquilo que já se espera dele: um congresso mais internacional. Temos feito um bom caminho e este ano iremos também honrar o compromisso de trazer nomes fortes. Acho que vai ser um congresso muito bom.
Bernardo Trindade – Em 2011, quando saí do governo, perguntou-me como é que iria continuar a intervir e aquilo que eu disse, procurando um pouco de respaldo para o facto de ter aceitado o convite do Luís Veiga para fazer parte da sua lista à Direção da AHP, foi que nós podemos intervir politicamente pela via associativa. A AHP é uma instituição associativa representativa do setor da hotelaria mas que intervém politicamente nestas dimensões que a Cristina Siza Vieira tão bem elencou. O Programa HOSPES, quando fazemos a ligação entre as instituições protocoladas e os hotéis, os 230 mil bens que já doámos desde o início deste programa, o compromisso que temos com a sustentabilidade, tudo isto são compromissos políticos na aceção mais pura da sua realidade que é a nossa relação com a comunidade em que nos inserimos.
Quando o congresso tem uma dimensão institucional mais forte é uma dimensão que procura sair das nossas fronteiras hoteleiras e ligar-nos à comunidade em que nos inserimos. Obviamente, este tema da mudança tem desafios, desde logo enfrentá-la – é preciso refletir sobre como enfrentamos e como enfrentaremos a mudança – e por outro lado, há outra questão muito importante: o setor hoteleiro é um setor de capital intensivo, que exige muito músculo financeiro – já o é em condições normais mas em função do momento que estamos a viver isso coloca-se de uma maneira ainda mais atual.
Recursos humanos, perceber como é que podemos olhar para o setor e encontrar as novas formas de financiamento, as clássicas e as mais atuais, designadamente com a presença de parceiros que tradicionalmente não faziam parte do capital das empresas, as tendências da procura, saber como as companhias aéreas estão a olhar para Portugal e perceber como é que o setor aéreo se reorganizou depois de ter sido tão afetado pela pandemia – tivemos boas notícias relativamente à Lufthansa que reembolsou uma parte muito significativa do empréstimo que tinha com o Estado alemão – saber quais os desafios que a TAP pela frente. Tudo isto são matérias que vamos procurar abordar no nosso congresso.
Nota: Na próxima quinta feira iremos publicar a entrevista com o presidente da Associação da Hotelaria de Portugal, Bernardo Trindade, em que abordaremos temas como o balanço do ano turístico, a recuperação das empresas, os desafios que se colocam à hotelaria e o investimento, entre muitas outras questões.
in Turisver