80% dos hotéis fechados com recuperação adiada para 2024
Raul Martins, presidente da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP), considera que as últimas medidas do Governo revelam “um perfeito desconhecimento do sector”.
Se o sector nacional do turismo se confronta com um cenário desolador há meses, a actividade da hotelaria está no mesmo barco à deriva. “Neste momento, encontram-se encerrados cerca de 80% dos hotéis a nível nacional”, avisa o presidente da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP), em declarações exclusivas ao Jornal Económico.
Raul Martins destaca que nas situações de insolvência, a hotelaria tem uma dimensão empresarial “mais elástica e até ao eclodir da crise pandémica as empresas estavam mais capitalizadas”. Pois, diz, “tinham amortizado dívida nos bons anos e por isso estavam bastantes sólidas”. Já os hotéis que abriram recentemente, e aqueles que já estavam numa situação difícil, “terão de encontrar soluções de restruturação financeira para não ficarem insolventes ou encerrarem”, explica.
“Os meses foram passando e a situação foi-se agravando. Em junho, o inquérito aos hoteleiros dava nota de que metade dos hotéis em Portugal estavam encerrados e para os meses de verão (julho, agosto e setembro) cerca de 25% a 30% das unidades hoteleiras estariam encerradas, mas este período acabou por ser muito bom para alguns destinos, como é o caso do Alentejo e do Centro”, explica Raul Martins.
Sobre o impacto destas quebras da hotelaria na economia nacional, o líder da AHP sublinha que “o peso da hotelaria nas receitas turísticas, é muito expressivo”. “Tendo por referência 2019, o melhor ano turístico de sempre, em que as receitas turísticas ascenderam a 18,4 mil milhões de euros, e sabendo que as receitas da hotelaria refletem 25% desse total, significa que nesse ano pesámos 4,48 mil milhões de euros”, acrescenta.
O mesmo responsável chama a atenção para o facto de as receitas não decorrerem só das dormidas em hotelaria (nesse ano tivemos 58 milhões de dormidas nas unidades hoteleiras), mas de todas as outras unidades de negócio dentro dos hotéis: restauração [F&B – Food & Beverages, ou seja, alimentação e bebidas], tratamentos de estética e bem estar, eventos, congressos e reuniões, entre outras. “Assim, porque em 2020 as perdas estimadas pela AHP são enormes: pelo menos 70% das dormidas (menos 40 milhões de noites) e 80% das receitas (menos 3,6 mil milhões de euros) perdidas. Imagine só na nossa área o impacto que tal gera nas receitas totais”, lamenta Raul Martins.
Ainda há poucas semanas, a AHP apontava o segundo trimestre deste ano, Páscoa incluída, como o reinício da atividade para a hotelaria. Num inquérito realizado pela European Travel Commission, no final de 2020, mais de metade dos europeus inquiridos diz pretender viajar nos próximos seis meses, um terço dos quais já na Primavera, e principalmente em lazer. Contudo, Rui Martins sinaliza: “sabemos que não irá acontecer, pois está dependente da aceleração do processo de vacinação”.
O presidente da AHP precisa que “retoma e recuperação não são a mesma coisa”, vaticinando que “as perdas de 2020 e 2021 (...) só serão recuperadas ao longo dos próximos quatro ou cinco anos”, pelo que aponta “a recuperação da hotelaria para valores de 2019 apenas em 2024”.
Questionado sobre o balanço que faz da atuação do Governo durante a pandemia em curso, o líder da AHP entende que “atuou de forma muito rápida e eficiente na primeira fase da pandemia, o que foi fundamental para as empresas, mas os apoios da segunda vaga tardaram, o que para a hotelaria foi difícil”.
Com o novo encerramento do país, para este responsável as medidas anunciadas para a hotelaria “demostraram um perfeito desconhecimento do sector”. Frisa que os hotéis “estão a fazer um verdadeiro serviço público, visto que só as pessoas que por motivos profissionais ou outros similares é que se podem deslocar para os hotéis”. E considera “incompreensível” que os hotéis não possam prestar serviço de refeições aos hóspedes, como até aqui. “Considerando que estão 80% dos hotéis encerrados, a hotelaria tem de ter acesso ao lay-off simplificado, uma vez que permite o pagamento da TSU [Taxa Social Única], o que irá reduzir os custos das empresas e manter os postos de trabalho”, alerta Raul Martins.
in Jornal Económico